Alisson Barreto

O porquê de extremismos nas relações interculturais

Alisson Barreto 05 de junho de 2022



No mundo atual, cada vez mais globalizado e com intercâmbio cultural cada vez mais tendente ao instantâneo – ideologias, filosofias, teologias e ignorâncias dos mais variados grupos antropológicos são postos em contato num nível cada vez mais desafiante à capacidade civilizatória humana. Nessa realidade, na qual a propensão social dos indivíduos de manterem-se em sua “zona de conforto social” é posta em xeque, a capacidade de lidar, interagir e reagir às próprias crenças são postas em relevo, diante do desafio do testemunho a dar a quem vem de uma realidade antropológica diferente.

Ironicamente, consideráveis massas estão — tomadas pelo ímpeto da autopreservação coletiva, com tamanha intensidade que seus mecanismos de defesa da preservação de suas realidades e crenças sociais circundantes lançam-nas a depositar suas energias no seguimento de lideranças polarizadoras que energicamente rechaçam os pensamentos e as pessoas que não se enquadram no pensamento ou comportamento esperado por seus pares. Talvez uma forma inconsciente de tentar mascarar suas limitações ou débeis capacidades de dialogar com o outro diferente.


A verdade é que, neurologicamente, é mais fácil reagir com impulsos primitivos que abrir-se ao diálogo que possa pôr-se diante da necessidade do reconhecimento de que há um universo fora da caverna mental em que se vive. E o que muitos não sabem é que podem estar nessa caverna, ainda que tenham galgado os mais elevados postos sociais da profissão que exercem, seja na esfera executiva, legislativa ou judicial, seja no poder público ou privado, seja saindo-se bem nos diálogos ou mal.

É natural, por conseguinte, que grupos fechados vejam — em pessoas que levantem as vozes em defesa dos seus ideais, crenças e expectativas — pedaços de si e marcas do que almejam ou entendam ser o certo. Dessa forma, tais pessoas que se tornaram protagonistas de suas bolhas passam a não serem mais vistas como apenas um político ou líder religioso, mas um símbolo do que há de mais profundo e importante a ser defendido.

Dessa forma, nos contatos com culturas distintas – e entenda cultura distinta não apenas aquela com povos distantes, mas com pessoas que as cercam, mas são distantes umas das outras por suas crenças, cores ou realidades econômicas – as pessoas tendem a defender a manutenção do que lhes causa paz, conforto ou conformação, inclusive quando o que lhe proporciona estar na área de conforto seja desconfortar o outro.

Aliás, o ímpeto de causar desconforto ao outro é algo tido como uma vitória em bolhas preocupadas com a competitividade argumentativa ou meritocracia egoística – e nisso incluo a meritocracia que favorece os pares em oposição à solidariedade. Estamos em época em que muitas pessoas buscam satisfação em atitudes medíocres que se refletem em termos como “fechação” e “lacração”. O altruísmo, a inclusão e a solidariedade estão perdendo espaço para o banimento, a exclusão e a cultura do cancelamento. A ideologia da força e sua filha, ideologia da guerra, têm tomado espaço e favorecido a lei do mais forte, cegando muitos à relevância evolutiva da proteção aos mais fracos e inclusão social.

Por fim, nota-se que há mecanismos de defesa do ego que, tomados por anseios de uma espécie de senso de preservação, de talvez um inconsciente coletivo, acabam por atrair de tal forma os indivíduos que podem chegar a levá-los a trair até mesmo crenças outrora defendidas, como amar o próximo e respeitar a vida humana.

Assim, muitos — por apego àqueles que foram tomados como símbolos de defesa de seus ideais e a o que eles enfaticamente pregam — acabam afastando-se de valores básicos como tratamento civilizado; respeito ao direito de pensar diferente; direito à vida, da fecundação à morte natural; direito à democracia; respeito aos direitos sociais e trabalhistas conquistados; direito de um país à soberania e à paz; dentre outros.

Aliás, vale recordar um direito básico: ninguém é obrigado a associar-se ou permanecer associado e disso, acrescento: direito a não tomar partido por direitismo ou esquerdismo. É preciso defender o direito fundamental do ser humano de poder escolher o caminho da temperança, da virtude, do equilíbrio e da proporcionalidade, sem ser coagido a tomar partido por extremismo, seja ele de direita ou de esquerda.



Maceió, 4 de junho de 2022.


Alisson Francisco Rodrigues Barreto

  • Sobre o autor:
    Alisson Francisco Rodrigues Barreto é poeta, filósofo (Seminário Arquidiocesano de Maceió), bacharel em Direito (Universidade Federal de Alagoas), pós-graduado em Direito Processual (Escola Superior de Magistratura de Alagoas), com passagens pelos cursos de Engenharia Civil (Universidade Federal de Alagoas) e Teologia (Seminário Arquidiocesano de Maceió). Autor do livro “Pensando com Poesia”, escritor na Tribuna com o blog “Alisson Barreto” (outrora chamado de “A Palavra em palavras”), desde 2011. O autor, que é um agente público, também apresenta alguns dos seus poemas, textos e reflexões, bem como, orações no canal Alisson Barreto, no Youtube, a partir do qual insere seus vídeos aqui no blog.

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