Jurídico com Alberto Fragoso

A responsabilidade das locadoras de veículos em casos de sinistros

Jurídico com Alberto Fragoso 15 de novembro de 2021
A responsabilidade das locadoras de veículos em casos de sinistros
Reprodução - Foto: Assessoria

De acordo com entendimento consolidado dos Tribunais do país, inclusive através de enunciado sumular do Supremo Tribunal Federal, as locadoras de automotores também são responsáveis por danos oriundos de sinistros causados por condutores (particulares) de veículos tomados via contrato de aluguel, independentemente de sua concorrência para a produção do resultado dano, respondendo de forma objetiva (sem a necessidade de comprovação de culpa) pelo prejuízo daí causado.

Isto porque, como entidades empresariais, as locadoras de veículos desempenham atividade que pressupõe aquisição de lucro, importando na absorção de todos os riscos do negócio operado. Assim, para reparação, basta apenas a demonstração dos elementos ensejadores da obrigação de indenizar: a) a conduta (ainda que exclusivamente imputada ao locatário do veículo); b) nexo de causalidade (liame de causa e efeito); e c), por fim, o evento danoso, que é consubstanciado pelos prejuízos materiais produzidos pela ação ilícita do condutor.

Em se verificando o resultado danoso, nasce para o lesado, nas hipóteses de acidentes de trânsito ou quaisquer outros episódios que resultem em prejuízo, o direito de ser indenizado, facultando ao mesmo, caso não haja composição amigável e extrajudicial, o ajuizamento de demanda contra o condutor (locatário) isoladamente, contra a locadora do veículo exclusivamente, mesmo que atribuída apenas ao condutor a ação lesiva, ou contra os dois sujeitos (locadora e locatário).

Estas últimas possibilidades, em especial a derradeira (solidariedade da obrigação de ressarcir), se consistem, em muito, por obra de construção da jurisprudência que acabou desembocando na formulação dos parâmetros jurídicos da Súmula nº. 492, do STF. Por este vetor sumular, restou consubstanciado o entendimento que as empresas que exploram, com o propósito de lucro, a atividade de locação de veículos devem responder, civil e solidariamente, pelos danos causados a terceiros pela utilização de carros ainda que estejam locados.

Aliás, este raciocínio já está pacificado, reiterando-se muitos julgados no mesmo sentido. O trecho que segue é parte de voto num acórdão proferido, em recurso de apelação, que retrata bem os contornos da obrigação de indenizar pelas locadoras de veículos em que pese o dano ter sido provocado exclusivamente pelo locatário: “Na verdade, aquele que lucra com uma situação (locação de veículos) deve suportar o ônus decorrente da atividade que exerce no seu próprio interesse. Daí porque a ré, no exercício regular de sua atividade mercantil ou como prestadora de serviço, tem obrigação de indenizar o dano causado a terceiro, ainda que resultante de culpa exclusiva do locatário do veículo. Em outras palavras, a responsabilidade é decorrente do risco da atividade exercida em caráter lucrativo, afigurando-se irrelevante tenha a locadora agido com culpa ou não, restando-lhe, por força da Súmula n° 492 do E. Supremo Tribunal Federal, responder solidariamente pelos danos causados pelo locatário; ou seja, sua responsabilidade é objetiva bastando, para tanto, a caracterização do dano e o nexo causal com a conduta imputada ao locatário”. (BRASIL. TJSP. 26ª Câmara de Direito Privado, AC nº. 39828920088260471, Des. Rel. Renato Sartorelli, Data de Julgamento 27.06.2012, DJe 29.06.2012).

No mesmo sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. LOCADORA DE VEÍCULOS. LEGITIMIDADE. RESPONSABILIDADE. A locadora de veículos tem legitimidade passiva para responder à demanda em decorrência do acidente de trânsito envolvendo o seu veículo. Súmula 492 do STF. Precedentes do STJ. Sequer alegada a falta de culpa do motorista do veículo de propriedade da locadora, descabe afastar a sua responsabilidade pelo sinistro. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME”. (BRASIL. TJRS. 12ª Câmara Cível. AC nº. 70074637893. Des. Rel. Pedro Luiz Pozza. Data do Julgamento 07.11.2017. DJe 09.11.2017).

Seguindo o idêntico espírito, o Superior Tribunal de Justiça, confirmando a obrigação de reparação dos danos produzidos por acidentes de trânsito apesar de culpa exclusiva do locatário do veículo, assim se pronunciou a respeito: “AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. LOCAÇÃO DE VEÍCULO. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 522 DO CPC. SÚMULA STF/284. LEGITIMIDADE PASSIVA. SÚMULA STF/492. DECISÃO AGRAVADA. MANUTENÇÃO. [...] II. A empresa locadora de veículos responde, civil e solidariamente com o locatário, pelos danos por este causados a terceiros, no uso do carro locado (Súmula STJ/492). III. Agravo Regimental improvido". (BRASIL. STJ. 3ª Turma. AgRg no Ag 1208187/PB, Rel. Min. Sidnei Beneti, data do julgamento 05/08/2010, DJ de 16/08/2010).

Como percebido, não importa se o dano ao terceiro tenha sido provocado por ato direto da locadora do veículo alugado e se está presente a sua concorrência, culposa ou não, à produção do evento. Explorando a atividade empresarial do lucro, pela prestação de serviços de aluguéis de veículos, a locadora já fica vinculada, antecipadamente, a qualquer resultado danoso cometido pelos locatários, inferindo-se, por seu turno, que a indenização ao prejudicado é sintetizada pela necessidade de amparo à vítima do sinistro, sobretudo pela possibilidade da eventual falta de condições financeiras do locatário ou mesmo de seu sumiço.

Foram estas premissas lógico-circunstanciais, inclusive, que ensejaram a formatação do referido verbete sumular nº. 492, do STF, traduzidas, igualmente, pelos seguintes fundamentos: a) necessidade de diligência, por parte do locador, destinando parte de seu lucro à cobertura de uma eventual insolvência do locatário em caso de acidente; b) interesse, tanto do locador quanto do locatário, na utilização do veículo; e, c) deve preponderar o amparo à vítima, evitando que essa se depare com situação em que os danos não sejam reparados por falta de condições do locatário, ou por seu desaparecimento após o sinistro (STJ, REsp 906.035/AC).

Desse modo, cabe às locadoras de veículos a obrigação de indenizar aqueles lesados em seus patrimônios ainda que por ato imputado aos locatários (condutores), podendo essas empresas responder solidariamente pelo ressarcimento dos danos materiais apurados, caso em que será perfeitamente admitida ação regressiva contra o condutor do veículo, que agiu com culpa, a fim de se reembolsar daquilo que foi destinado à reparação material do terceiro.