Alisson Barreto
À Praça
10 de fevereiro de 2021
À Praça
Saio à praça e vejo um bar. Diante dele, carros luxuosos cujos donos, arrodeados de mulatas*, em debochados risos, viravam branquinhas, como se cachaças fossem águas no deserto. Eis que uma delas ergue a mão, aponta e chama uma jovem que passa: -Galega, junte-se a nós!. Ao juntar-se, esta emenda um convite ao rapaz que passa: -Moreno, gostas de pinga? Se sim, junte-se a nós!. Eis que o rapaz, revoltado, olha para ela e rebate: -Quem és tu para chamar-me de moreno?Acaso eu me reduzo à cor? Aliás, não sou moreno, mas negro. Mas quem és tu para chamar-me pela cor? Um silêncio explosivo tomou conta do lugar. Dali saí, não quis julgar. Porém, com a sensação de que havia uma etnia que poderia citar cores e outra não. Fiquei confuso com a situação e prossegui, quero paz no meu coração. Na praça uma árvore e diante dela dois homens discutiam. Um indagou se poderia chamá-la de maça verde. E eis que dela cai um coco em sua mão, enquanto gesticulava. O outro disse: -Melhor irmos ao hospital. Parece-me que a “maçã verde” quebrou-lhe a mão. Fiquei a observar a naturalidade com que aqueles dois renomeavam as coisas. Mas as coisas não deixavam de ser o que são por mera mudança de nome. Segui adiante, então, e sentei-me à sombra de uma árvore. Fiquei a apreciar as águas de um riacho, enquanto ouvia um casal discutir sobre conservadorismo e progressismo. Pensei: as águas que aqui escorrem mudam-se a todo instante, há um progresso e, ao mesmo tempo, é o mesmo riacho, portanto, também é conservação. Novas águas e mesmo riacho; portanto, o riacho não era mais o mesmo, mas isso não o fazia deixar de ser aquele riacho. O mesmo riacho, o tempo todo, já não era mais o mesmo e era assim para que continuasse sendo o mesmo riacho. Encostei-me na árvore e fechei os olhos. Enquanto eu pairava, continuava eu mesmo, mas minhas células se renovavam. Se era progresso ou regresso, não sei, mas algumas das células que me compunham deixavam de fazer parte de mim e outras surgiam. Eu não sou mais eu, a cada instante, mas em cada instante, eu sou sempre eu. No fim, muitos são os nomes que dão as coisas. Alguns as delimitam, outros as qualificam, mas as coisas são como são. Quantas e quantas pessoas a discutirem os acidentais, incapazes de enxergarem o essencial! E tu, que aí estás, como vais e quem és? Não sei se te conheço, mas és especial. Maceió, 10 de fevereiro de 2021.Alisson Francisco Rodrigues Barreto
*O termo “mulatas” foi aqui empregado em sentido didático, ou seja, como pessoa descendente da mistura de etnias branca e negra. Nesse sentido, é possível observar sites didáticos como o Cola Web, como se pode constatar em https://www.coladaweb.com/historia-do-brasil/os-povos-no-brasil-miscigenacao (acesso em 10 de fevereiro de 2021). Trata-se de classificação empregada, por muitos anos, nos livros didáticos brasileiros. Palavras-chave: progresso, evolução, conservadorismo, liberal, liberalismo, progressismo, ideologia, direita, esquerda, praça, rio, riacho, filosofia, reflexão Obs.: Link compartilhável para acesso ao vídeo do autor: https://youtu.be/VSd_cYm_nN0 Sobre o autor: Alisson Francisco Rodrigues Barreto é poeta, filósofo (Seminário Arquidiocesano de Maceió), bacharel em Direito (Universidade Federal de Alagoas), pós-graduado em Direito Processual (Escola Superior de Magistratura de Alagoas), tendo também cursado, parcialmente, os cursos de Engenharia Civil (Universidade Federal de Alagoas) e Teologia (Seminário Arquidiocesano de Maceió). Autor do livro “Pensando com Poesia” e escritor do blog “Alisson Barreto” (outrora chamado de “A Palavra em palavras”), desde 2011, e da Revista Pio. Alisson Barreto na internet: Site pessoal: Alisson Barreto, acesso em https://sites.google.com/view/alissonbarreto Canal Alisson Barreto, no Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCqtpMzyLava_Z0hkmh75WAw Revista pessoal do autor: Revista Pio, acesso em https://alissonbarreto14.wixsite.com/revistadigital-pio "Blog" do autor: Alisson Barreto, acesso em http://tribunahoje.com/blog/a-palavra-em-palavras/ Twitter: @alissonbarreto1 (acesso em https://twitter.com/alissonbarreto1) LinkedIn: @alissonbarreto1 (acesso em https://www.linkedin.com/in/alissonbarreto1/)Alisson Barreto
Sobre
Alisson Francisco Rodrigues Barreto é poeta, filósofo (Seminário Arquidiocesano de Maceió), bacharel em Direito (Universidade Federal de Alagoas), pós-graduado em Direito Processual (Escola Superior de Magistratura de Alagoas), com passagens pelos cursos de Engenharia Civil (Universidade Federal de Alagoas) e Teologia (Seminário Arquidiocesano de Maceió). Autor do livro “Pensando com Poesia”, escritor na Tribuna com o blog “Alisson Barreto” (outrora chamado de “A Palavra em palavras”), desde 2011. O autor, que é um agente público, também apresenta alguns dos seus poemas, textos e reflexões, bem como, orações no canal Alisson Barreto, no Youtube, a partir do qual insere seus vídeos aqui no blog.