Alisson Barreto

Os óculos do “estou bem” e o estetoscópio do “estou aqui”

Alisson Barreto 28 de agosto de 2019
Os óculos do “estou bem” e o estetoscópio do “estou aqui”
Reprodução - Foto: Assessoria

Os óculos do “estou bem” e o estetoscópio do “estou aqui”

O que se esconde por trás das palavras e de gestos

Por Alisson Barreto Publicado em 27/8/2019

Parte 1

Há muitos “como você está?” que, na verdade, são um “sou uma pessoa legal falando com você”. E há muitos “estou bem” que ocultam um “eu quero acreditar no que falo” ou “sua pergunta está sendo respondida com conveniência”. Há muitas entrelinhas pouco lidas.

Diga-me o que falas.

Mas não me ocultes o que pensas.

E eu buscarei amar-te.

Muitas pessoas cumprimentam e ocultam discursos de preocupação com outras, quando na verdade estão apenas ocupadas consigo próprias. Ocupações que giram em torno do marketing pessoal, existente mesmo em pessoas com missões de cuidados públicos e pastoreios. Ocupações oriundas de cegueiras na capacidade de enxergar o outro. É impressionante como as pessoas são alheias aos corações alheios!

Estarei dessarte a me ocupar contigo.

É no agir que me faço amigo.

Quando meu coração é abrigo.

E te enxergo, na verdade.

É importante ocupar-se consigo próprio, mas se não conseguir sair da área de conforto para alcançar a outrem o egoísmo tomará conta do próprio coração e a alma sofrerá por não fazer o que mais a realiza: amar, dar amor. A transcendência do eu começa com o olhar para dentro do outro e se desenvolve na saída da zona de conforto para alcançar o novo, levando o Sempre Novo para a nova realidade que passa a abraçar, para o novo ambiente que com tal ato de amor passa a iluminar.

Só quando te vejo no íntimo eu te vejo como és.

Quando enxergo quem és que te posso amar.

Talvez não chegue a teus pés, mas sempre te haverei de buscar.

Sobre a área de ação desse amor, há três tipos básicos que requerem atenção. (1) Há o agir junto aos desconhecidos, deixando os familiares e próximos de lado; (2) o agir junto aos familiares, não avançando para os de fora deste círculo; (3) e o agir junto apenas a si mesmo, deixando o eu escravo do próprio eu, matando o agir altruísta da própria alma.

Olho para mim e preciso ir além.

Se cuido dos de longe preciso enxergar os de perto.

Se para os de perto me volte, eu não ignore os que não alcanço.

De um jeito ou de outro, de que preciso amar é certo!

Parte 2

Não é só nas questões de meio ambiente que há argumentações que ocultam os verdadeiros interesses. Há muitos que falam mal dos bois do vizinho para ocultar só maus tratos com os próprios cavalos. Quando o ser humano não supera a sua incapacidade de lidar com os próprios problemas e foca nos problemas alheios, apenas aumenta a quantidade de sujeira debaixo dos próprios tapetes. Uma hora esses tapetes terão tanta areia debaixo que o farão escorregar. Depois, ele ainda vai atribuir isso à lei de Murph ou ao princípio da incerteza de Heizberb, quando é apenas um efeito da teoria do caos.

Nos olhos, o mundo tem muita trave.

Mas acha que a chave de sua limpeza

É voltá-los para ciscos em Marte.

Quando foi a última vez que você fez algo para aquele seu filho, aquela sua vizinha ou colega de trabalho que ajudou em algo? Mais ainda, quando foi que você olhou para alguém e viu uma necessidade de algo? Quando foi que você ou seu grupo (da Igreja, de estudos, de festas etc.) viu que alguém se ausentou e você não foi atrás procurar saber o que houve e ajudar? O amor vai além das afirmações. O amor faz mais do que apenas esperar.

O homem tão pouco navega dentro de si

Que se esconde em aeronaves.

Na sua insuficiência em amar,

Acaba multiplicando entraves.

O “estou bem” pode ser uma faixada, mas é importante que o seu “estou aqui” não o seja. Digamos isso para nós mesmos.

Enxerga, pois, o ser humano que se dificulta.

Abre os olhos e escuta:

Há muito mais a dizer do que as palavras podem revelar.

Uma boa semana a todos!

Amar, buscar, ouvir.

Olhar, enxergar, sair.

Enxergar além do que o externo mostra

Envereda no que consiste amar!

No dia de Nossa Senhora dos Prazeres, padroeira da Arquidiocese de Maceió, 27 de agosto de 2019,

Alisson Francisco Rodrigues Barreto1

1 Poeta, filósofo (Seminário Nossa Senhora da Assunção); bacharel em Direito (Universidade Federal de Alagoas), pós-graduado (Escola Superior de Magistratura de Alagoas). Autor do blog “A Palavra em palavras”, em TribunaHoje.com, desde 2011. @alissonbarreto1 (LinkedIn, Twitter e Instagram)