Alisson Barreto

Racionalmente, o que está acontecendo com o mundo?

Alisson Barreto 17 de março de 2019
Racionalmente, o que está acontecendo com o mundo?
Reprodução - Foto: Assessoria

Racionalmente, o que está acontecendo com o mundo?

  Ligar a TV ou tomar o celular na mão e se deparar com notícias de chacinas, terrorismos e tantas outras cenas de intolerância e violência com que nos deparamos. Quantos e quantos de nós têm medo ao sair às ruas e o resultado disso é uma época recordista em depressão, ansiedade e violências. Mas o que está acontecendo com o mundo? Tomemos um tempo para refletir. O mundo não é um videogame. Então, não faça roleta russa com seu carro em um sinal, nem brinque de passar finos com sua moto. Pode ser sua última diversão. Seres humanos não são deuses. Então, não pense que seus filhos podem tudo nem que você também pode tudo. O planeta terra não é o Monte Olimpo e o que se faz gera consequências. Um risco pode provocar resultados que você pode não estar preparado(a) para encarar. A vida não tem botão de reiniciar nem a opção “vidas infinitas”. Seres humanos não são números e as outras pessoas não são criaturas feitas para realizar o que você mentalizou. Também não são gênios da lâmpada a cumprir todos os seus desejos. A existência da subjetividade não faz deixar de existir realidades objetivas. A valoração dos sujeitos não pode ser o endeusamento do “eu”. O favorecimento da subjetividade não pode ser encarado como edificação do império de relativismos absolutos. Dizer que é doença ou que não é doença, por si, não resolve a salubridade. Assim, dizer que mania de roubar é doença pode ser tornar uma aprovação à impunidade das corrupções e dizer que algumas coisas não podem ser estudadas como possibilidade de síndromes ou frutos de doenças pode implicar o favorecimento de distorções na própria natureza do ser. Em outras palavras, dizer que anemia falciforme ou síndrome de Klinefelter não são anormalidades genéticas pode resultar em um descuido com as necessidades especiais que tais pessoas possam ter. Se um indivíduo disser que o problema da fome em seu país é decorrente de um alienígena enviado pelos Estados Unidos isso não resolve o problema da fome nem faz o imaginário ser passar da ficção da frase para a existência no mundo real. Assim, se se considerar que todo crime é, axiologicamente (ou seja, valorativamente, não juridicamente), uma corrupção e alguém disser que (1) corrupções morais e desvios de caráter são questões patológicas e (2) questões patológicas não são passíveis de prisão. A consequência é que (A) ninguém poderia ser preso e (B) todos os criminosos teriam que ir para detenções psiquiátricas ou voltarem para o convívio social. Aliás, a própria honra à dignidade da pessoa humana fica prejudicada (1) quando se sabe que ela lhe é inerente à condição de ser humano – o que se sabe, biologicamente, ocorre desde a concepção – e (2) depois dizer que o ser humano só passa a ser pessoa após o nascimento com vida. Tal prejuízo se amplia quando se dilui o valor humano em etapas da vida, separando do gênero de crime homicídio suas espécies. Em palavras mais simples: feminicídio, infanticídio e abortamento, por exemplo, são tipos de crimes contra seres humanos e, portanto, devem ser considerados tipos de homicídios [homo (homem, no sentido de ser humano) + cídio/caedere (matar, imolar, derrubar). Ao contrário do que uma presidenta (sim, a gramática já acolhia essa forma antes da de uma mulher se tornar presidente) disse, não existe “mulher sapiens”, pois a mulher não é um ser vivo de espécie distinta do homem] e não serem, por ficção jurídico-legislativa, considerados crimes diversos do homicídio. São crimes que, em sua natureza, fazem parte do gênero homicídio. Mas não é isso o que, majoritariamente, é ensinado nos livros e faculdades de direito. O problema é que ali prevalece o conceito positivo de que se o crime Ca ocorre se Pa for a pessoa que comete a infração A contra a pessoa P. Ora, se uma lei disser que indivíduos com genética humana não são pessoas em determinadas situações, então não haverá crime; pois, para o entendimento jurídico predominante, se um indivíduo não é pessoa (P) o crime Ca inexiste pois não se enquadra na tipicidade. Exemplificando: se a lei diz que um indivíduo só passa a ser pessoa após o nascimento com vida, tirar a vida antes do nascimento, segundo tal lógica não seria crime Ca (ainda que pudesse se enquadrar em outro tipo de crime: Cb ou Cc, por ex.). No caso do abortamento, se a lei diz que o abortamento ocorre quando se mata um indivíduo de genética humana antes do nascimento (para a lei brasileira, ele ainda não tem personalidade jurídica e não é considerado pessoa natural, pois não nasceu), ainda que que a lei põe a salvo os direitos do nascituro [o que faria do nascituro um sujeito de direito e, por conseguinte, pessoa jurídica. Mas muito se defende, no meio jurídico brasileiro, que o nascituro teria apenas expectativa de direito, por não ter nascido (com vida), ainda que o art. 2º do código civil fale, expressamente, em “direitos do nascituro”], se uma lei posterior diz que é permitido o abortamento em determinadas situações, desde que com menos de 20 semanas (por ex.), nesse caso, inexistiria crime porque a lei disse que não é crime. Ora, a lei dizer que não é crime não faz com que o indivíduo humano deixe de perder a vida. Se a lógica de a lei dizer que um nascituro de poucos dias não seria gente, então não seria gente estivesse correta; então, se uma lei dissesse que negro não é gente então, acaso o negro não seria gente? Insistindo ao absurdo: se colocarem na Constituição Federal um artigo que diga “está revogada a lei da gravidade” a lei da gravidade vai deixar de ter eficácia e efetividade, no Brasil? Há, portanto, na sociedade atual, dois problemas evidentes: (1) um causado pela troca da lógica científica pelo argumento de interesses de uma sociedade, como nos parágrafos acima, e (2) um decorrente da deturpação e das más interpretações dos termos, como abaixo explanado. Uma sociedade centralizada na ficção terminológica e ignorância da natureza das coisas. Uma pedra não deixará de ser uma pedra por você a chamar de algodão doce. Porém, muitas vezes as pessoas reconceituam termos, dando-lhes novos significados, editando seus significados para as gerações posteriores. Isso acontece ora por preciosismo ou entendimento de que um termo se tornou pejorativo ou já o era sem que se percebesse, ora por interesses ideológicos. Portanto, a “ressignificação” pode ir, facilmente, de um zelo por um indivíduo a uma manipulação social. Portanto, cuidado com o movimento de que você pode estar participando e com o que você está curtindo ou compartilhando em redes sociais digitais, pois você pode estar sendo manipulado para a persecução de fins ideológicos com os quais nem sonha. Nem todo que disser “Senhor, Senhor!” entrará no reino de Deus (Mt 7,21). Também nem todo o que diz ajudar um indivíduo ou minoria estará buscando o bem comum ou autêntico bem ao destinatário do benefício. Palavras são algarismos manipuláveis e, por conseguinte, pessoas também o são. Voltando à questão da pedra, se uma pessoa disser que uma pedra é uma construção social e a descartar como sem importância para uma dada edificação. E para esta edificação disser que algodão doce é uma construção social e tentar edificar um prédio com algodão doce, o que acontecerá quando chover? Ora, Deus Se fez Homem para que a humanidade pudesse tê-lo como referência, ou seja, verdade absoluta que serve de referência às construções subjetivas da verdade nos indivíduos. Uma vez que as sociedades dos tempos mais recentes vêm negando o caráter angular da Pedra que é o Filho de Deus e o caráter sólido da pedra escolhida para edificar o Corpo do Filho, ou seja, sobre a qual Deus edifica a Igreja, que é o Corpo de Cristo (o Filho de Deus). Tais sociedades optaram por edificar suas casas nos terrenos movediços do relativismo temporal, em vez da solidez de edificar suas casas sobre a Pedra que vence o tempo e realiza o ser humano em sua plenitude. Em outras palavras, quando o homem troca o verdadeiro que vem de Deus (1) por versões sobre o que cada um entendeu sobre a revelação [que é uma subjetiva instrumentalização (consciente ou não) da Palavra, fazendo passar por verdade objetiva de Deus o que é verdade subjetiva do intérprete] ou (2) pelas versões pagãs, que negam a Deus ou buscam caminhos que tentem colocá-Lo no esquecimento ou irrelevância. Nessas trocas, o homem constrói prédios de algodões doces edificados em areias movediças. Em tais construções, o homem pode criar engrenagens para tentar se adaptar às areias movediças e fazer do algodão doce algo sólido, mas nunca consegue libertar-se das amarras do desperdício e das desgraças decorrentes da opção tomada. O resultado é uma sociedade em que constantemente se invertem papéis e valores, chegando a exaltar contravalores e condenar virtudes. Estamos numa época em que grupos pedem a legalização das drogas com a abertura das prisões junto com a negação da legítima defesa e um exército sem usar armas. Grupos que não se incomodam em ver bandidos com fuzis e traficantes oferecendo drogas dentro das escolas. Grupos que querem, nas escolas, aprovação sem aprendizado; segurança pública sem investimento em segurança pública; ordem social sem combate ao crime e corrupção. Gente que se alegra com o “rouba, mas faz” e acha que a anarquia é uma forma de democracia. Que desvalora a fé e luta por uma “demoniocracia” totalitária por meio do favorecimento da “cleptocracia” e enfraquecimento da efetividade (eficácia social) das leis. Ou seja, buscam um poder demoníaco de retenção do poder nas próprias mãos, por meio do favorecimento da corrupção e da impunidade. Uma sociedade que, em meio à mobilidade da areia sob seus pés, divide-se entre os que defendem mergulhar junto com a areia e os que ficar pulando sobre os corpos que ali afundam ou buscar pedras que deslizam sobre a areia movediça. Como seria mais fácil se apenas buscassem a Pedra que eles próprios rejeitaram. O que tais pessoas não percebem é que o julgo é doce e o fardo é leve para os que optam por construírem suas casas sobre a Pedra. E que a areia movediça sob os prédios de algodão doce não é um mero fluxo de água em areia, mas larvas vulcânicas prontas a devorar os cidadãos que se confiam sobre ela. Que o bom senso retorne e a capacidade cognitiva do homem, criado pensante e propenso à fé, desperte e as mentes humanas acordem para a importância de buscarem suas dignidades na plenitude que vai além das intempéries mundanas! Que o ser humano acorde para o valor das coisas que não passam, que se mantêm e propiciam ao homem crescer em seu valor e abraçar sua dignidade de ser criado à realidade celeste! Assim, o homem aprenderá a amar, respeitará o ser humano sem enxergar as cores de seus times ou os números de seus votos. Será o dia em que filhos e pais se tratarão sob a égide do amor e estudantes não confundirão os desafios virtuais com as realidades da vida natural. O ser humano, por mais que se iluda com as sensações, é vocacionado ao amor e à unidade com a perfeição só encontrada em Deus. Que Deus nos ajude e a humanidade reaprenda a amar e dar valor à vida, reconhecendo o valor natural das coisas e pessoas, da realidade que a circunda! Um grande abraço a todos. E uma boa quaresma!  

Maceió, 14 de março de 2019.

Com amor e orações,

Alisson Francisco Rodrigues Barreto[1]

  [1] Poeta, filósofo; bacharel em Direito, pós-graduado. Fundador dos Amigos Marianos Missionários da Eucaristia – Amme (reunião todo 3º sábado de cada mês às 15h, na paróquia de Santa Rita, Maceió). Autor do blog A Palavra em palavras, na Tribuna, desde 2011.