Jurídico com Alberto Fragoso

A afetividade e sua repercussão nas relações de família

Jurídico com Alberto Fragoso 29 de julho de 2015
A afetividade e sua repercussão nas relações de família
Reprodução - Foto: Assessoria

Ultimamente, venho dando entrevistas sobre questões de Direito de Família. Nessas discussões, percebo que afetividade sempre se apresenta como parâmetro de interpretação e aplicação legal.

Assim, para fomentar ainda mais o debate, trago um breve análise do julgamento do Recurso Especial nº. 1.087.163/RJ, do Superior Tribunal de Justiça.

Nessa decisão, esse Tribunal acenou pronunciamento muito palpitante.

Entenda-se, resumidamente, o caso: após o término da relação amorosa, a mulher, grávida, inicia outro relacionamento. O homem, mesmo sabendo da existência da gravidez da companheira, deseja registrar a criança como pai. E assim foi feito quando do nascimento.

Tempos depois, o pai biológico, ao tomar conhecimento de sua paternidade, propôs ação de alteração de registro de nascimento com a finalidade de declarar o seu vínculo de parentesco e, por tabela, extinguir a filiação do pai afetivo – que registrou anteriormente a menor.

A discussão bateu às portas do Superior Tribunal de Justiça por meio de recurso especial (Resp nº. 1.087.163/RJ) interposto pelo pai afetivo, tendo em vista o acolhimento da tese do pai biológico pelo Tribunal inferior.

Ao analisar o recurso especial, o pai afetivo sagrou-se vitorioso apesar ter sido realizado o exame de DNA e comprovada a paternidade do pai biológico.

Na hipótese, embora o resultado conclusivo do exame de DNA, o pai afetivo externou a vontade de manter a filiação, a teor dos laços amorosos nutridos até então com a menor. Esta circunstância pesou no deslinde do conflito.

O assunto tem pano para manga. Este arrazoado se limitará, por isto, a considerações diminutas.

Quando se refere a direitos da criança e do adolescente, o sistema legal do país titula, com certa rigidez, diversas normas para assegurar a intangibilidade dos interesses dos menores.

Tal proteção começa a se erigir, por razões óbvias, a partir da própria na Constituição Federal, a qual impõe a todos a obrigação de garantir, em absoluta prioridade e de maneira integral, aos infantis o direito positivo e subjetivo à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227, da CF). Foi, enfim, a intenção do legislador constituinte.

De igual forma, a legislação infraconstitucional – Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criança e Adolescente – elenca e institui os aparelhos ordinários de guarda das pessoas dos menores que, por suas qualidades específicas de vulnerabilidade, são garantidos, afirmativamente, por imperativa prestação institucional do Estado (Ministério Público, Conselhos Tutelares, Poder Executivo e o próprio Poder Judiciário, este último quando instado) e demais colaboradores com interesses sociais ou filantrópicos.

Sem dúvidas, a presença dos pais, não se importando o gênero da relação – afetiva ou biológica –, é de irrefutável importância para a formação cívica e do caráter dos menores, pois é, nesta fase, que são construídos os valores educacionais, morais, éticos e religiosos que estarão presente durante toda a existência da pessoa.

O exercício da guarda e, no caso visto, da autoridade parental, será sempre imputado àquele que ostentar melhores condições de educação, amparo, acolhimento, amor, afinidade e afetividade. São tais referências, aliás, que orientam o prumo para a consolidação dos interesses que mais atendam às necessidades das crianças e adolescentes.

Desta feita, a decisão contemplou o melhor interesses da criança, além a preferência ao processo de desenvolvimento nos aspecto moral, mental, espiritual, religioso e tantos outros, arregimentados, na perspectiva, pela oferta de melhores condições com dignidade humana dentro de um convívio familiar harmonioso.

O intento do ordenamento jurídico se consubstancia, portanto, em conferir, aos menores, estrutura familiar coesa, densa, segura e todos os elementos necessários a um crescimento equilibrado.

Assim, o caso foi decidido pela inalterabilidade do registro civil à luz dos significados da afetividade, mantendo-se intacto o vínculo de parentesco do pai afetivo porque evidente a ligação paternal e afetiva cultivada com a menor pelos anos de convivência.