Escritos

Padaria Belo Horizonte: mais de 40 anos de história despedaçados

Por Rívison Batista 03/07/2022 09h05 - Atualizado em 04/07/2022 10h12
Padaria Belo Horizonte: mais de 40 anos de história despedaçados
Repórter Rívison Batista entrevista o empreendedor Dirceu Buarque - Foto: Edilson Omena

A família de Dirceu Buarque foi uma daquelas famílias que fez todas as apostas no bairro do Pinheiro. Segundo relatou o empreendedor, ele, o pai, a mãe e os irmãos chegaram em Maceió há mais de 40 anos. Vindo diretamente de União dos Palmares, o pai de Dirceu observou com cuidado onde iria fixar sua família na capital alagoana. O Pinheiro rapidamente mostrou-se uma opção irrecusável, pois era perto de tudo. "Estávamos perto da Avenida Fernandes Lima, perto do Centro. Meu pai viu um futuro maravilhoso no Pinheiro. Não é à toa que esse bairro cresceu tanto", relembra.

A Padaria Belo Horizonte nasceu em 1980 na Rua Professor José da Silveira Camerino, a antiga Rua Belo Horizonte, uma das principais vias do bairro. "Meu pai foi criado em fazenda, mas era um cara com uma visão maravilhosa para negócio. A gente analisou que havia aquela necessidade no local, o bairro estava em crescimento, então resolvemos fundar a padaria", disse.

O início 

A demanda era tanta por uma padaria na antiga Rua Belo Horizonte que o estabelecimento ficou a menos de 100 metros de outra padaria no bairro do Farol, algo que não era permitido pelo plano diretor da Prefeitura de Maceió naquela época, mas que houve a permissão para que a população da localidade fosse beneficiada. "Foi uma luta para provar que tinha que existir uma padaria ali, porque a padaria mais próxima ficava do outro lado da Fernandes Lima. Então havia o perigo dos moradores ficarem atravessando a avenida para ir nessa panificação. Nós conseguimos o alvará com muita luta. Virou a padaria da comunidade", disse.

Desde o início, Dirceu conta que muitos clientes criaram um vínculo especial com a Padaria Belo Horizonte. "Padaria de comunidade é como consultório de psicólogo. Todo mundo falava sobre a vida, contava os problemas", recordou. E foi assim que se solidificaram muitas amizades entre a clientela e os donos do estabelecimento.

A padaria foi a única fonte de renda para a família de Dirceu e ele relembra orgulhoso que o pai conseguiu pagar os estudos de todos os seus irmãos. "Quem queria se formar, se formou", relembra. "No final, eu fiquei com a padaria junto com meu pai. Gerenciei durante muitos anos. E, quando ele ficou mais velho, eu assumi de fato. Meu pai faleceu, comprei a parte dos meus irmãos e a padaria ficou sendo propriedade minha", disse.

O tremor em Maceió e o início do fim

"Nós sentíamos no semblante daquele pessoal que algo grave estava acontecendo", assim Dirceu Buarque se refere às primeiras visitas dos técnicos do Serviço Geológico do Brasil após o tremor de solo que aconteceu em Maceió no dia 3 de março de 2018. O terremoto aconteceu em uma tarde de sábado e teve magnitude de 2,5 graus na escala Richter. Vários bairros maceioenses foram atingidos pelo abalo e aquilo foi o prenúncio de que algo não estava correto no subsolo da capital.

Depois que ficou comprovado que o tremor foi causado pela atividade de mineração da Braskem, Dirceu conta que foi difícil aceitar que o Pinheiro estava afundando e teria que abandonar o local. "Nem em pensamentos, eu conseguia imaginar uma coisa daquela. Não conseguia aceitar. Hoje, eu acho que vivo em um eterno pesadelo. Hoje, eu acordo de manhã e me pergunto: o que eu vou fazer?", questiona.

A padaria de Dirceu foi fechada definitivamente no dia 31 de dezembro de 2021. Ele conta que o movimento de clientes foi caindo gradativamente após o tremor de solo de 2018. "Depois que foi relatado que havia um perigo de colapso naquela região, muitas pessoas evitavam até de parar por perto da padaria. Tinha gente que evitava de passar pela rua. E aí começou o êxodo dos moradores", disse.

O comerciante diz que a tradicional padaria estava com um faturamento de menos de 40% depois de 6 meses de comprovação do afundamento de solo na região. Segundo Dirceu, seus funcionários ainda não foram indenizados, porque a Braskem não se responsabilizou por isso. "Eles são responsáveis pela demissão dos meus funcionários, só que até hoje não pagaram nada", afirma. 

Toda família de Dirceu sofreu com o fim abrupto do negócio. Sua filha seguia os passos do pai e assumiria a padaria, mas teve que desistir do sonho. A esposa de Dirceu teve problemas relacionados à saúde mental após todo o transtorno que passaram. Hoje, o comerciante evita até passar na frente do antigo negócio. "Era um comércio que tinha história. Era um negócio que tinha vida. Eu evito visitar o túmulo do meu pai. Por que eu tenho que visitar o túmulo do negócio?", finaliza, visivelmente emocionado.