Política

“Expectativa é superar Bolsonaro”, diz cientista político

Ranulfo Paranhos analisa a criação de um “Centro Democrático” criado por cinco partidos

Por Carlos Amaral com Tribuna Independente 09/06/2018 08h59
“Expectativa é superar Bolsonaro”, diz cientista político
Reprodução - Foto: Assessoria
Na última semana, cinco partidos lançaram um documento com o objetivo de configurarem como forças de centro no país. Entre eles estão o PSDB e o MDB, ambos com nomes apresentados para a disputa presidencial deste ano, mas sem conseguir despontar nas pesquisas, que apontam Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PSL) como líderes nas intenções de voto. A preferência a Lula pelo eleitorado já era esperada, mesmo com sua candidatura podendo ser anulada pela Justiça eleitoral, mas o fato de Bolsonaro se manter consistente na segunda colocação tem assustado os partidos mais à direita no Brasil. Para o cientista político Ranulfo Paranhos, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), a intenção é fortalecer um nome para se contrapor aos polos líderes nas pesquisas. Fernando Henrique Cardoso (FHC) chamou esse conjunto de “Centro Democrático”. Tribuna Independente – Na última terça-feira, cinco partidos – PSDB, MDB, PPS, PSD e PTB – lançaram um documento intitulado “Manifesto por um polo democrático e reformista”. Isso é uma tentativa de se diferenciar da direita que o Bolsonaro representa? Ranulfo Paranhos – Por regra, toda estratégia de política é: ou manutenção ou elevação de seu status. Qualquer ação nova ou repetição de uma que deu certo serve para garantir isso. Qual o cenário que está dado hoje? Temos um modelo de campanha para o Executivo, o que mais deu certo até este momento, é esse modelo Bolsonaro. Mas a expectativa de todos é se quando começar efetivamente a campanha política, com tevê e recursos de campanha que o Bolsonaro não tem, esse modelo dele segue vingando e atraindo voto. A deles é que não. Além dos recursos e da televisão, há também o poder de transferência dos prefeitos que é mais forte que a capacidade individual de conseguir votos. Quando você repara as prefeituras do PSDB, do MDB, por exemplo, eles têm muitas prefeituras. O Bolsonaro não tem isso. Tribuna Independente – Eles tentaram ampliar esse leque, inclusive com a Rede, da Marina Silva; também chamara o DEM, mas não tiveram sucesso. É clara a tentativa de montar uma coalizão em alternativa, segundo as pesquisas, ao Lula (PT) – ou Ciro Gomes (PDT) – e ao Bolsonaro. É isso mesmo? Ranulfo Paranhos – Isso é um vislumbre do FHC. Ele percebe que é preciso montar uma frente porque o modelo PSDB/DEM parece que não vai vingar. E nesse intento ele pensou em chamar a Marina, que é um nome que agrega valor a todos os lados do espectro ideológico. Tem gente mais ao centro, à esquerda e à direita que vota nela. Essa é uma estratégia clara, mas como não estamos nas eleições ainda, é preciso fazer que um desses candidatos cresça. Mas onde está o problema? Marina, por exemplo, demora em tomar decisões e sempre perde o timing. Tribuna Independente – Esse campo foi denominado pelo FHC de “Centro Democrático”, mas o DEM – antigo PFL – que é de direita foi chamado para compô-lo e, ao mesmo tempo, a Rede, que está à esquerda. Esse campo é centro mesmo? Na verdade, existe centro no Brasil? Ranulfo Paranhos – Existe. Tem uma rodada de pesquisas feita entre parlamentares que atesta que eles têm comportamento de centro, de esquerda e de direita. Uma vez ou outra se pode mudar um pouco esse comportamento, mas no geral os partidos se comportam em função dos espectros [ideológicos]. Agora, onde quanto mais você chamar partidos para esse ‘Centro’, que forem de espectros diferentes... Por exemplo, se eu pegar um partido mais à direita ou mais à esquerda, eu tenho dificuldade de montar uma agenda única. Aí está um problema, inclusive para montar uma agenda de governo. Lula às vezes encontrava problema quando tentava juntar a agenda do PCdoB com a do PL [hoje, PR], por exemplo, que era mais à direita. Quanto mais eu estico o espectro ideológico, maior dificuldade haverá de conduzir uma agenda, até mesmo de campanha. Se eu juntar hoje PTB e Rede, haverá dificuldades porque eles terão propostas diferentes para problemas diferentes. Tribuna Independente – O senhor afirma que existe centro no Brasil, mas o que configuraria esse espectro político? A esquerda, ao menos no Brasil, defende mais intervenção do Estado na economia e pauta questões transversais como a homofobia, por exemplo; a direita é mais liberal na economia e mais conservadora nos costumes. Ranulfo Paranhos – Quando eu penso no centro, do ponto de vista da economia, é o campo que não quer o Estado muito interventor, tampouco que deixe o mercado ditar tudo. É o campo que se defende que o Estado crie políticas econômicas, mas com o mínimo de intervenção. O meio termo seria criar políticas amplas, mas não fazer intervenção direta. Do ponto de vista dos costumes, um governo de centro seria aquele que diz ‘eu deixo as pessoas decidirem’. Se coloca os temas para o debate, mas o governo não assume postura nem conservadora, nem progressista. Os que as pessoas decidirem, o Estado vai tutelar. Por exemplo, se é vontade dos indivíduos que pessoas do mesmo sexo se casem, o Estado deve tutelar, dar as garantias. É, mais ou menos, o que o Ciro Gomes falou em sua entrevista no programa Roda Vida da TV Cultura: ‘Eu não vou ser guru de costumes’. Tribuna Independente – E nesse clima político que o Brasil vive, que mais parece um jogo entre o CSA e o CRB, há espaço para o centro ou esse espectro passa ao largo no debate? Ranulfo Paranhos – Cabe, mas nesse momento essa é a principal dificuldade do Geraldo Alckmin, que está sendo de centro – ele nem tá virando Bolsonaro ou a outra ponta, um Guilherme Boulos [PSOL] ou Ciro Gomes – e percebeu que não cresce nas pesquisas com essa proposta. Recentemente, ele atacou o Bolsonaro, por exemplo, por não ir aos debates. Ele mexe nas feridas para tentar radicalizar um pouco mais seu discurso, que é um discurso antirradical, pois não desafia ninguém, não chama ninguém para a briga. Agora, é esse discurso de centro que não está surtindo efeito, mas no final das contas, a maioria dos eleitores tem comportamento de centro. Sempre tiveram. Os eleitores não estão, em sua maioria, nem na direita nem na esquerda. Uma série de estudos aponta que boa parte das propostas da eleição do Lula em 2002 comungava com as ideias de centro. Ele pegou o espectro da esquerda e junto com o espectro de direita do PL e conseguiu vencer as eleições.