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Capital da alta tecnologia na Índia sofre com dificuldade de abastecimento de água

'Silicon Valley' indiana teve explosão demográfica nos últimos 25 anos, chegamos a 10 milhões de habitantes

Por AFP e G1 17/03/2018 21h01
Capital da alta tecnologia na Índia sofre com dificuldade de abastecimento de água
Reprodução - Foto: Assessoria
Cada dia mais de mil caminhões-pipa cheios de água passam em frente à pequena loja de Nagraj em Bangalore, levantando uma nuvem de poeira no caminho das casas e dos escritórios da capital indiana da alta tecnologia. Neste "Silicon Valley" do sul da Índia, que testemunhou em 25 anos uma explosão demográfica e vê os novos edifícios de moradias se multiplicarem, a cidade não consegue distribuir a quantidade suficiente de água corrente a seus residentes. Muitos moradores dependem dos depósitos abastecidos a partir de poços gigantescos. Essa superexploração do subsolo provoca uma preocupante redução dos lençóis freáticos e gera preocupações de que Bangalore venha a ser a primeira metrópole indiana com escassez de água. "Há uma grave falta de água aqui", disse Nagraj, 30 anos, que se mudou para o subúrbio de Panathur há uma década e acompanhou a urbanização desenfreada. "No futuro será difícil. É impossível imaginar como encontrarão água, como viverão. Mesmo cavando a 450 metros de profundidade, não há água", disse, alarmado. Mais de mil caminhões-pipa cheios de água são enviados a Bangalore por dia. Imagem mostra algusn deles em 27 de fevereiro de 2018 (Foto: MANJUNATH KIRAN / AFP) 'Cidade agonizante' Está muito longe do tempo em que Bangalore era conhecida como "a cidade dos jardins". Na época, o local era famoso por sua vegetação e pelo clima. Era destino de aposentados em busca de dias aprazíveis. O auge das empresas de informática indianas, na maioria estabelecidas em Bangalore no começo dos anos 1990, transformou o lugar até torná-lo irreconhecível. De 3 milhões de habitantes em 1991, sua população passou aos 10 milhões atuais, porque o dinamismo econômico atraiu trabalhadores de todo o país. Muitos dos lagos que tornaram a cidade famosa desapareceram. O cimento substituiu as plantas aquáticas. Símbolo dos males da metrópole, o grande lago Bellandur está tão contaminado de substâncias químicas que às vezes se incendeia de repente ou produz uma espuma química invasora que obriga as autoridades a erguer barreiras para impedir que inunde a pista. Bangalore, na Índia, sofre com dificuldade de abastecimento de água. Imagem de 27 de fevereiro mostra construções próximas ao lago Varthur (Foto: MANJUNATH KIRAN / AFP) "A cidade está morrendo", disse T.V. Ramachandra, especialista em meio ambiente do Instituto de Ciência indiano. "Se a tendência atual de crescimento e urbanização continuar, até 2020 94% da paisagem será de cimento". Agora mais da metade de Bangalore deve perfurar a terra em busca de água ou criar cisternas como paliativo para a escassez de água corrente. No mês passado, a Suprema Corte teve que intervir. Para resolver necessidades urgentes do centro da alta tecnologia indiana, a mais alta instância judicial da nação fez um acordo de compartilhamento das águas do rio Cauvery entre Karnataka, a região de Bangalore, e o estado vizinho de Tamil Nadu. A maior parte da água municipal da cidade vem dessa disputada fonte de água, que atravessa Karnataka e depois Tamil Nadu, antes de desembocar no golfo de Bengala. Há dois anos, uma decisão judicial ordenou que Karnataka soltasse a água para aliviar a seca que ameaçava os cultivos de seu vizinho e desencadeou distúrbios fatais em Bangalore. Centenas de empresas tiveram que permanecer fechadas durante os confrontos. Bombeiros trabalham para conter fogo no poluído lago de Ballandur, em Bangalore, na Índia, em 20 de janeiro de 2018. Cidade sofre com a falta de água. (Foto: MANJUNATH KIRAN / AFP) Recoleta de chuva Para T.V. Ramachandra, as precipitações anuais poderiam ser suficientes para amenizar a sede da cidade se a recoleta de água da chuva fosse mais eficiente. "Se há uma crise de água, não deveríamos planejar o desvio do rio. Deveríamos pensar em reter água da chuva", disse, criticando a ausência de ampla visão urbana para enfrentar a atual situação de precariedade. Como acontece no restante da Índia, os cidadãos têm pouco hábito de economizar água. Apesar dos anos de seca, a água corrente é muito subsidiada e o acesso aos lençóis freáticos, pouco regulado. "Em Bangalore, o equivalente a 1.000 garrafas de água tratada e limpa chega em casa e só pagamos seis rúpias" (o equivalente a nove centavos de dólar), disse A.R. Shivakumar, cientista do Conselho Estatal de Ciência e Tecnologia de Karnataka. Apesar disso, Shivakumar e sua família não usaram uma gota de água municipal nos 23 anos em que vivem em Bangalore. Eles utilizam um sistema de recoleta de chuvas graças a canais que levam a água a cisternas situadas debaixo de sua casa. Um sistema que também foi instalado em paradas de ônibus, na rede de metrô e que as autoridades tornaram obrigatório para as casas novas. "A nova geração presta uma grande atenção ao meio ambiente e às medidas de conservação", considera o cientista. "Isso fará as coisas avançarem."