Cidades

Jovem quebra barreiras, conclui gastronomia e abre próprio negócio

Felipe prova que a estimulação é fundamental para um down levar uma vida normal

Por Texto: Marcel Vital com Agência Alagoas 18/03/2018 19h21
Jovem quebra barreiras, conclui gastronomia e abre próprio negócio
Reprodução - Foto: Assessoria
Quando uma criança nasce com síndrome de Down, alteração genética caracterizada pela presença de um cromossomo extra nas células do indivíduo, a princípio os pais podem imaginar que ela será dependente para o resto da vida. Mas, a estimulação precoce e o acompanhamento multidisciplinar de profissionais da saúde, são capazes de mudar esta realidade, tornando o down uma pessoa ativa e capaz de levar um vida normal, a exemplo do jovem Felipe Martins, 28 anos, que concluiu o curso de gastronomia e, atualmente, possui o próprio negócio, batizado de Hot Dog do Lipe. Filho da professora Kátia Martins, 54 anos, ele representou um desafio, para que a sociedade entendesse que uma criança com síndrome de Down pode ser igual a qualquer outra. “Eu trabalhava como bancária e, ao mesmo tempo, cursava ciências contábeis. No entanto, logo depois do nascimento do meu filho, prestei vestibular para pedagogia, cujo propósito era entender essa deficiência intelectual e, assim, passei a dedicar-me a ele.” Aos cinco meses de vida, Felipe foi submetido a uma cirurgia para corrigir um problema no coração, que dificultava o crescimento e o aumento de peso. “Aos cinco meses, ele tinha apenas dois quilos e, a única maneira de reverter àquela situação, era uma cirurgia. Após o procedimento, ele estava mais gordinho, rechonchudo. Então, foi aí que comecei a fazer as estimulações precoces, logo após a recuperação do procedimento cirúrgico”, recorda Kátia Martins. O Chef Lipe  Felipe sempre gostou de cozinhar e, por conta disso, decidiu investir no curso de gastronomia. Antes mesmo de concluir os estudos na universidade, em dezembro do ano passado, o jovem decidiu colocar a mão na massa e preparar cachorros-quentes gourmet, o famoso hot-dog, para vender em seu carrinho vermelho com amarelo personalizado, aos domingos, das 10h às 14h, na rua fechada, localizada na orla de Ponta Verde, em Maceió. “Como é uma coisa que eu gosto, tanto de comer quanto de fazer, então resolvi preparar alguns sanduíches mais elaborados”, diz ele, timidamente. No cardápio, além da salsicha tradicional, há também opções de três molhos caseiros, como os sabores três queijos, cebola caramelizada e chutney de tomate. O sanduíche ganha um toque especial com os acompanhamentos de maionese com ervas, mostarda com mel e queijo em lascas, que harmonizam ainda mais o sabor da carne bovina. Felipe chega a vender cerca de 60 cachorros-quentes aos domingos, e o sucesso é tanto que, desde a inauguração do empreendimento, os pedidos para festas e aniversários não pararam de chegar, seja por telefone ou pela sua página no Instagram, o @cheflipehotdog. Família é Alicerce Segundo ela, a família é um verdadeiro alicerce para qualquer criança, auxiliando no seu desenvolvimento e potencializando a sua aprendizagem. “Embora algumas pessoas pensem diferente, é exatamente isso que uma criança com síndrome de Down também precisa. Eles têm todo um potencial, mas a gente, como família, precisa descobrir e encaminhar, dando todo o suporte, para que eles possam sonhar e, posteriormente, concretizar os seus projetos, independente das escolhas”, frisou. A mãe acrescentou que, mesmo após o término da universidade, o filho ainda sente falta da rotina. “Os estudos o fizerem crescer não apenas profissionalmente, mas, também, como pessoa. A autoestima dele melhorou muito. À época, ele conviveu com colegas da sua faixa etária e isso o fez despertar ainda mais para o mundo. As pessoas o enxergaram não como um menino portador de síndrome de Down, mas, como um homem, na sua totalidade”, contou. Preconceito Entretanto, nem sempre foi assim. Ao longo do caminho, existiram muitas barreiras para serem quebradas, principalmente da sociedade. De acordo com Kátia, o preconceito antigamente era muito forte, o que vem mudando conforme o tempo vai passando. “Já ouvi de tudo nesta vida. Por exemplo: de eu chegar à escola e ouvir que já tinham problemas demais para matricular o meu filho. Ou então, as escolas que o aceitavam, quando eu chegava lá, o Felipe não se encontrava na sala de aula, e sim com o pessoal da limpeza ou com os funcionários da cozinha. A propósito, isso me fez mais forte. Não dava tempo de eu parar e ficar me lamentando”, ressaltou. Embora trabalhe muito, Felipe encontra na agenda espaço para viajar, sair com os amigos para barzinhos nos finais de semana e, claro, namorar. Vive uma vida praticamente normal, sem nenhum problema. Há três anos e 10 meses ele conheceu, no reforço da aula particular, seu grande amor. Seu maior sonho, hoje em dia, é casar. Ter um longo caminho onde o respeito e a fidelidade sejam as palavras-chave para ultrapassar qualquer dificuldade. Para Kátia, o filho foi uma experiência que a transformou por dentro e a fez ser mais forte. A parte do seu pilar, seu castelo, seu mundo de emoções, a mão pela qual lhe mostra o mundo. “A força dele é a minha força. O sorriso dele é o meu sorriso. Tem dias em que eu acordo com vontade de ficar na cama, mas quando o vejo, me dá aquela coragem de levantar, continuar e lutar”, declarou, emocionada. E acrescentou: “A gente tem que acreditar sempre. Tem que procurar realmente o que eles querem e o que os fazem felizes. Cada um tem o seu ritmo. A falta de informação consistente sobre essa condição faz com que muitos preconceitos ainda existam em relação a esse tema. É necessário que a família dê todo o suporte, para fazer com que as coisas aconteçam, e os sonhos deles, por sua vez, tornem-se realidade.” Atendimento Humanizado Em Alagoas, as crianças com a síndrome de Down – cujo Dia Internacional ocorre nesta Quarta-feira (21) –, podem fazer a estimulação precoce em qualquer um dos 13 Centros Especializados em Reabilitação (CERs), que estão localizados em Maceió, Arapiraca, Penedo e Santana do Ipanema. Eles possuem equipe multiprofissional composta por fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos e fonoaudiólogos, fazendo o acompanhamento motor e intelectual. Para a supervisora de Cuidados à Pessoa com Deficiência da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), Renata Bulhões, quanto mais cedo for o início do tratamento e, sendo feito de maneira adequada, essas crianças poderão ter uma vida saudável e estarem incluídas na sociedade. “Nos CERs, essas crianças conseguem desenvolver as condições psicomotoras e são estimuladas, também, a inclusão social. Há uma melhora na qualidade de vida para a criança e para a família, que terá a oportunidade de ter uma vida totalmente independente no futuro”, diz. Além dos CERs, ainda existem diversas associações para ajudar e acolher as pessoas com Síndrome de Down junto com os familiares, como o Instituto Amor 21, a FamDown, a LifeDown, a Apae, a Pestalozzi, a Adefal e AAPPE. A Casa do Coraçãozinho, inaugurada em dezembro de 2016, com atendimento exclusivo para usuário do Sistema Único de Saúde (SUS), também acolhe a crianças com a síndrome de Down e que possuem problemas cardíacos.