Brasil

Como policiais civis se associaram ao PCC em nome de traficantes

Ministério Público denunciou 8 policiais por supostamente cometer práticas criminosas na região de Taubaté, interior de São Paulo

Por R7 07/02/2018 18h43
Como policiais civis se associaram ao PCC em nome de traficantes
Reprodução - Foto: Assessoria
Denúncia oferecida pelo MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo), na 3º Vara Criminal de Taubaté (SP), mostra como oito policiais civis da Dise (Delegacia de Polícia de Investigações sobre Entorpecentes) atuavam, supostamente de maneira criminosa, para permitir a atuação de traficantes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) na região do Vale do Paraíba. O R7 teve acesso a documentos do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), do MP-SP, que incluem depoimentos de testemunhas, interceptações telefônicas, fotos, entre outros materiais obtidos de 28 de março de 2015 a 29 de janeiro de 2016, que seriam provas da ligação dos policiais civis suspeitos com o crime organizado da região. “O único órgão da Polícia Civil especializado na investigação e combate ao tráfico de drogas em Taubaté e região iludiu a sociedade, prejudicou pessoas, alguns inocentes, e trabalhou na proteção e no interesse de um grupo de importantes traficantes”, denunciou o Ministério Público. O R7 apresenta, nos próximos dias, uma série de reportagens que aponta, conforme denúncia do MP-SP, como os policiais civis, supostamente, faziam para permitir o tráfico de drogas na região. E mais: mostrar serviço fazendo pequenas apreensões na cidade. Nos documentos do Ministério Público, uma denúncia anônima cita um carnê que os policiais civis recebiam do suposto chefe da facção criminosa PCC na cidade de Taubaté. Esse homem seria o responsável por comandar o tráfico de drogas na região. A investigação ainda aponta que, para mostrar serviço, os policiais civis apreendiam adolescentes e pequenos traficantes da região. Em alguns casos, conforme a denúncia, os policiais invadiam casas, forjavam flagrantes e até inventavam denúncias anônimas para mostrar que atuavam no combate ao tráfico de drogas. Segundo o promotor de Justiça Alexandre Affonso Castilho, do Gaeco do Vale do Paraíba, as investigações iniciaram para desarticular uma organização criminosa com integrantes da facção criminosa PCC em Taubaté. O promotor ainda explica que, na primeira fase da investigação, “alguns policiais foram interceptados com autorização judicial com telefones cadastrados nos nomes deles” e, a partir disso, teria sido descoberto a ligação com supostos traficantes. MARCELO DUARTE RIBEIRO O delegado, de 49 anos, é apontado pelo MP-SP como o responsável por apoiar seus subordinados a realizar as práticas ilegais. Segundo o órgão, Marcelo era conivente com as “denúncias anônimas produzidas pelos próprios policiais para justificar diligências irregularmente empreendidas, invasões de domicílios, utilização de informações obtidas em interceptações telefônicas para fins espúrios, extorsões e ‘sapos’ [apreensões forjadas]”. “Não requisitamos a prisão dele, só o afastamento cautelar, por que entendemos que não havia elementos para a prisão. Mesmo que pedíssemos não conseguiríamos, mas fizemos uma análise mais técnica e entendemos que nesse caso a prisão não se aplicaria”, explica o Castilho. O promotor ainda afirma que “pelo histórico do Vale do Paraíba avaliamos que Marcelo não estava sozinho”, por isso “não tínhamos condições de comprovar que esses crimes foram a mando dele”. Já a defesa do delegado, feita pelo advogado Adilson José Vieira Pinto, afirma que “em nenhum momento ele foi denunciado por associação ao tráfico, nem nenhum ato de corrupção”. O advogado destaca que Marcelo está em liberdade e nunca sequer foi preso. Para Vieira Pinto, “houve um absoluto exagero por parte do Ministério Público” na denúncia de falsidade ideológica feita contra o delegado. Ele explica da seguinte forma: “Uma determinada pessoa foi ouvida pelo escrivão e ele assinou o respectivo termo como se ele tivesse feito as perguntas para a pessoa. Foram colhidas declarações de uma pessoa na delegacia, quem fez essa coleta foi um policial, e o delegado estava respondendo por duas unidades e ele não podia estar presente em dois lugares ao mesmo tempo. Entendeu o Ministério Público que ele não estava presente e houve um crime de falsidade ideológica. Existe um entendimento que houve um exagero acusatório.” IRAN CARVALHO O investigador, de 48 anos, que seria conhecido por Careca e Baixinho, foi condenado a 22 anos e sete dias de reclusão em regime fechado e seis meses de detenção, que devem ser cumpridos em regime semiaberto. Além disso, perdeu o cargo e foi inabilitado para exercer qualquer função pública no prazo de três anos. Segundo o advogado Leonardo de Almeida Maximo, seu cliente Iran Carvalho não tem envolvimento com tráfico de drogas na região. “Não foi interceptada nenhuma ligação, nenhum telefone dele foi identificado, ele nega peremptoriamente qualquer ligação com tráfico de drogas”. O defensor afirma que “não há nenhuma prova cabal do envolvimento” de Iran com os supostos traficantes citados pelo Ministério Público. Sobre a possível ligação do policial Iran com os homens apontados como traficantes na região, Maximo afirma que Iran só conhecia os suspeitos “de ouvir falar por conta de ser policial daqui [de Taubaté]”. “Ele conhecia, mas não recorda agora, de nome, quais ele já tinha ouvido falar. Mas de conhecer e ter qualquer contato pessoal, não tem nada disso, não tem nos autos, nenhuma ligação, nenhuma filmagem, nenhuma foto, nem informação de que ele tinha algum conhecimento ou algum contato com aquelas pessoas”, afirma o advogado. ADERSON LEANDRO SILVA PINHEIRO O agente policial, de 44 anos, que seria conhecido como Meninão, foi condenado a 39 anos, três meses e 18 dias de reclusão, a ser cumprido em regime fechado, e seis meses que devem ser cumpridos em regime semiaberto. O policial também perdeu o cargo e foi inabilitado a exercer qualquer função pública pelo prazo de três anos. A reportagem entrou em contato com o escritório do advogado Daniel Leon Bialski, que defende o agente policial. O advogado, no entanto, não estava e ficou de retornar o contato. O R7 também tentou contato com advogado Bialski via e-mail. Entretanto, não houve retorno por parte da defesa até a publicação desta reportagem. Atualização às 16h27 de quarta-feira (7): Em nota, as advogadas Thaís Pattineli e Juliana Bignardi, que pertencem ao escritório Bialski Advogados e fazem a defesa do policial Aderson, afirmaram que o agente policial é inocente. "As provas são fragilíssimas, amparadas em mera suspeita e deduções. Esperamos que o Tribunal de Justiça reverta a condenação editada em primeiro grau", destacou a defesa. FLÁVIO AUGUSTO DOS SANTOS O investigador, de 47 anos, teve a condenação de 39 anos, 11 meses e 27 dias de reclusão em regime fechado e sete meses, que devem ser cumprido em regime semiaberto. O investigador ainda perdeu o cargo e foi inabilitado a exercer qualquer função pública no prazo de seis anos. A reportagem conversou por telefone com o advogado Alexandre Almeida de Toledo, defensor do investigador Flávio Augusto. Ele disse que não poderia atender a reportagem e retornaria o contato. O R7 também enviou os questionamentos ao advogado por e-mail. Até a publicação desta reportagem, porém, não houve retorno. FLAVIO DA CRUZ O investigador, de 43 anos, que seria conhecido por Fofucho e Gorducho, foi condenado a 36 anos, um mês e sete dias de reclusão, a serem cumpridos em regime fechado e seis meses de detenção, que deve cumprir em regime semiaberto. O policial ainda perdeu o cargo e foi inabilitado a exercer funções públicas pelo prazo de três anos. A reportagem entrou em contato telefônico com o escritório do advogado Emilio Sanchez Neto, que defende o policial Flavio da Cruz. A informação passada ao R7 foi que o advogado não estava e retornaria quando possível. Até a publicação desta reportagem, no entanto, não houve retorno. O R7 segue tentando contatá-lo. MATHEUS LIMA BARBOSA O papiloscopista, 27 anos, foi condenado a 27 anos, um mês e 10 dias de reclusão em regime fechado e um ano e um mês de detenção em regime semiaberto. O policial ainda perdeu o cargo e foi inabilitado para desenvolver qualquer função pública pelo prazo de nove anos. O mesmo advogado do policial Flavio, Emilio Sanches Neto, faz a defesa do papiloscopista Matheus. Portanto, a informação dada à reportagem foi a mesma: de que Sanches Neto não estava em seu escritório. EYJI SUZUKI O carcereiro, de 43 anos, que seria conhecido por Japonês, foi condenado a 26 anos, 11 meses e 16 dias de reclusão em regime fechado e um ano de detenção, que deve ser cumprido em regime semiaberto. O policial perdeu o cargo público, além de ter sido inabilitado a exercer qualquer função pública no prazo de seis anos. O R7 não conseguiu contato com os advogados Deniz Goulo Vecchio, Karina da Cruz e Andre Folter Rodrigues, que defendem o carcereiro Eyji. Os três são sócios do escritório Cruz & Vecchio Sociedade de Advogados e, portanto, o contato deles disponíveis na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) não atende às ligações. A reportagem continua tentando contato. ALEXANDRE CAMPOS DE PAULA O investigador, de 49 anos, foi condenado a seis anos, dois meses e 20 dias de reclusão, que deve ser cumprido em regime fechado, e seis meses de detenção no regime semiaberto. Além disso, Alexandre foi inabilitado a exercer qualquer função pública pelo prazo de três anos, perdendo seu cargo. O R7 não localizou a defesa do investigador Alexandre. Segundo o promotor Castilho, Alexandre era chefe dos investigadores e “braço direito do delegado”. “Alexandre está solto, mas foi afastado das funções por decisão judicial. Pedimos apenas o afastamento cautelar em razão da mesma situação do contexto probatório em relação ao delegado. Também não conseguimos imputar a ele os mesmos crimes dos demais”, disse o promotor de Justiça. Secretaria da Segurança A reportagem também procurou a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) para se posicionar sobre o caso. Em nota, a pasta disse que foi instaurado processo administrativo para apurar as denúncias e que as armas e distintivos dos policiais foram retirados. Veja a nota na íntegra, enviada às 20h54 de terça-feira (6): "A Polícia Civil informa que instaurou processo administrativo para apurar as denúncias de irregularidades na conduta dos policiais. As investigações seguem em andamento pela 1ª Corregedoria Auxiliar da Polícia Civil. Cabe destacar que foram decretadas medidas cautelares contra todos os envolvidos, ou seja, foram retiradas armas, distintivos e os policiais transferidos para setores administrativos. Com exceção do delegado Marcelo Duarte Ribeiro e do investigador Alexandre Wagner Campos de Paula, os demais agentes encontram-se presos no Presídio Especial da Polícia Civil."